[INTERPRETAÇÃO] PARÓDIAS DA "CANÇÃO DO EXÍLIO", DE GONÇALVES DIAS
1. “Canção do exílio”, de Murilo
Mendes
Minha terra tem macieiras da
Califórnia
onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de
ametista,
os sargentos do exército são
monistas, cubistas,
os filósofos são polacos vendendo
a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por
testemunha a Gioconda
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia.
Ai quem me dera chupar uma
carambola de verdade
e ouvir um sabiá com certidão de
idade!
2. “Canto
de regresso à pátria”, de Oswald de Andrade
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que eu volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que eu volte para São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo
3. “Uma canção”, de Mário
Quintana
Minha terra não tem palmeiras...
E em vez de um mero sabiá,
Cantam aves invisíveis
Nas palmeiras que não há.
Minha terra tem relógios,
Cada qual com sua hora
Nos mais diversos instantes...
Mas onde o instante de agora?
Mas onde a palavra
"onde"?
Terra ingrata, ingrato filho,
Sob os céus da minha terra
Eu canto a Canção do Exílio!
4. “Canção do exílio facilitada”,
de José Paulo Paes
lá?
ah!
sabiá…
papá…
maná…
sofá…
sinhá…
cá?
bah!
5. “Terra
das palmeiras”, de Taiguara
Sonhada terra das palmeiras
Onde andará teu sabiá?
Terá ferido alguma asa?
Terá parado de cantar?
Sonhada terra das palmeiras
Como me dói meu coração
Como me mata o teu silêncio
Como estás só na escuridão.
Ah! minha amada amortalhada
Das mãos do mal vou te tirar
P'ra dançar danças de outras
terras
E em outras línguas te acordar.
6. “Outra
canção do exílio”, de Eduardo Alves da Costa
Minha terra tem Palmeiras,
Corinthians e outros times
de copas exuberantes
que ocultam muitos crimes.
As aves que aqui revoam
são corvos do nunca mais,
a povoar nossa noite
com duros olhos de açoite
que os anos esquecem jamais.
Em cismar sozinho, ao relento,
sob um céu poluído, sem estrelas,
nenhum prazer tenho eu cá;
porque me lembro do tempo
em que livre na campina
pulsava meu coração, voava,
como livre sabiá; ciscando
nas capoeiras, cantando
nos matagais, onde hoje a morte
tem mais flores, nossa vida
mais terrores, noturnos,
de mil suores fatais.
Minha terra tem primores,
requintes de boçalidade,
que fazem da mocidade
um delírio amordaçado:
acrobacia impossível
de saltimbanco esquizóide,
equilibrado no risível sonho
de grandeza que se esgarça e rompe,
roído pelo matreiro cupim da safadeza.
Minha terra tem encantos
de recantos naturais,
praias de areias monazíticas,
subsolos minerais
que se vão e não voltam mais.
7. “Canção do exílio”, de Raquel
Maythenand
Minha terra não tem palmeiras
E nem sabiá a cantar
As aves que aqui gorjeavam,
já foram para outro lugar.
Nosso céu não tem estrelas,
nossas várzeas não tem flores
Nossos bosques estão sem vida
e nossas vidas sem amores.
Ao cismar, sozinha, à noite,
não encontro mais prazer lá.
Minha terra não tem palmeiras
e nem sabiá a cantar.
Minha terra não tem primores
Que tais eu encontro cá.
Ao cismar, sozinha, à noite
Não encontro mais prazer lá.
Minha terra não tem mais
palmeiras
e nem sabiá a cantar.
Não permita Deus que eu morra
Antes de ver o meu Brasil mudar
Onde possa ver primores, que
agora não consigo enxergar
Minha terra não tem palmeiras
mas um dia ela terá.
8. “Canção do
martírio”, de Daniel Chaves
Minha terra
tem castanheiras, ouço o bugio e o curió
Nas estradas tem atoleiros, no verão levanta pó
Vim do lado da floresta, sem renome, sem canção
Sou um dos párias do Brasil, emigran’do Maranhão
Exilado em Boa Vista, estou à sorte “Deus dará”
No Beiral, no Pintolândia, Asa Branca ou Cambará
Meus parentes estão ilhados, para além do Anauá
Ah! Que saudade que tenho do meu velho roçado
Dos meus filhos pequenos, correndo, brincando pelados
Minha roça hoje é biscate, faltando um naco de pão
Meus filhos hoje em gangs, no cassete e afogão
Na fila pra pegar rancho, eu fico a meditar
Um dia eu tenho emprego, minha sina vai mudar
Que saudade do sul do estado, ali era meu chão
Sou macuxi,
sou roraimeiro e tenho nome, meu irmão.
9. “Canção
do exílio às avessas”, de Jô Soares
Minha Dinda tem cascatas
Onde canta o curió
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Minha Dinda tem coqueiros
Da Ilha de Marajó
As aves, aqui, gorjeiam
Não fazem cocoricó.
O meu céu tem mais estrelas
Minha várzea tem mais cores.
Este bosque reduzido
deve ter custado horrores.
E depois de tanta planta,
Orquídea, fruta e cipó,
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Minha Dinda tem piscina,
Heliporto e tem jardim
feito pela Brasil’s Garden:
Não foram pagos por mim.
Em cismar sozinho à noite
sem gravata e paletó
Olho aquelas cachoeiras
Onde canta o curió.
No meio daquelas plantas
Eu jamais me sinto só.
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Pois no meu jardim tem lagos
Onde canta o curió
E as aves que lá gorjeiam
São tão pobres que dão dó.
Minha Dinda tem primores
De floresta tropical.
Tudo ali foi transplantado,
Nem parece natural.
Olho a jabuticabeira
dos tempos da minha avó.
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Até os lagos das carpas
São de água mineral.
Da janela do meu quarto
Redescubro o Pantanal.
Também adoro as palmeiras
Onde canta o curió.
Não permita Deus que eu tenha
De voltar pra Maceió.
Finalmente, aqui na Dinda,
Sou tratado a pão-de-ló.
Só faltava envolver tudo
Numa nuvem de ouro em pó.
E depois de ser cuidado
Pelo PC, com xodó,
Não permita Deus que eu tenha
De acabar no xilindró.
10. “Nova
canção do exílio”, de Carlos Drummond de Andrade
Um sabiá na
palmeira,
longe.
Estas aves cantam
um outro canto.
O céu cintila
sobre flores úmidas.
Vozes na mata,
e o maior amor.
Só, na noite,
seria feliz:
um sabiá,
na palmeira, longe.
Onde tudo é belo
e fantástico,
só, na noite,
seria feliz.
(Um sabiá,
na palmeira, longe.)
Ainda um grito de vida e
voltar
para onde tudo é belo
e fantástico:
a palmeira, o sabiá,
o longe.
11. “Jogos florais I”, de
Cacaso
Minha terra tem palmeiras
onde canta o tico-tico.
Enquanto isso o sabiá
vive comendo o meu fubá.
Ficou moderno o Brasil
ficou moderno o milagre:
a água já não vira vinho,
vira direto vinagre.
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